Logo após a chegada de José Carlos da Mota às paragens de Mundo Novo em 1833, a primeira providência legal a ser tomada era comunicar o achamento das terras ao poder público da Comarca(1) mais próxima, pedindo solicitação para o registro de terras. Nesta época, a “Villa de Feira de Sant’Anna” era responsável pelas fiscalização das terras do sertão já descobertas ou a descobrir.
Ao tomar conhecimento das terras de Mundo Novo, foi solicitado ao vigário da Feira de Sant’Anna a vistoria, tendo o mesmo que dar prestação de contas sobre localização e aspectos geoclimáticos à Presidência da Província da Bahia, em Salvador. Observem o trecho a seguir(2)…
Acuso a recepção do ofício de V. Sª.; e ao seu conteúdo não dei immediatamente execução por achar-me fora da Fregª. na administração do Pasto espiritual às muitas ovelhas; o que agora minuciosamente o faço. As terras da Santana do Mundo Novo, descobertas e roteadas p. José Carlos da Motta, e outros muitos descobridores, julgo, e assim me asseverão pessoas fidedignas estarem nos limites da Capella de Monte Alegre filial à esta Fregª.; por isso q forão situadas no centro das matas incultas da mesma Capella doze a quatorze légoas, e distante do Rio Jacuípe por onde divide esta Freg. com a de Jacobina. He veridicamente o q tenho de informar a V.V. Sª. a quem Deos Guarde por muitos annos. Fregª. de Stª. Anna do Camisão, 7 de abril de 1835.
Ilmos. Snrs. Da Câmara Municipal da Villa de Feira.
O vigário Encom. Manoel Alves Moura(3)
A importância dessas informações para a Presidência da Província da Bahia estava na possibilidade de controlar a criação de rebanhos em território baiano, para saber exatamente a quantidade de carne que poderia ser solicitada para o abastecimento de Salvador, principalmente em épocas de crise ou secas prolongadas. Salvador dependia imensamente do gado criado no interior da Bahia e até em outras Províncias do Brasil para seu abastecimento. Mais uma vez a pecuária se torna ponto crucial para entender o crescimento de nossa cidade, ao contrário do que alguns renomados autores dizem em suas obras, como o poeta feirense Eurico Alves Boaventura. Segundo Boaventura…
“As matas de Mundo Novo só se abrem ao pastoreio, quando o século XIX já é quase uma lenda, isto é, nos últimos momentos do século, segundo se autentica através da publicação dos registros de terra. Iniciando o desbravamento de sua terras pela agricultura em 1833, por José Carlos da Mota, Joaquim José de Assunção e José Cabrinha, só depois, em 1898 se torna em zona de pecuária, com o fazendeiro ausente, no mais das vezes…”(4)
Talvez Boaventura esteja se referindo à época em que a criação bovina em Mundo Novo tenha se tornado mais extensiva, porque nossa cidade já figurava bem antes de 1898 como um importante centro fornecedor de gado para a Capital, fortalecendo a habilidade inata de nossos descobridores, como pode ser comprovado na seguinte correspondência trocada entre o encarregado de compra de gados para abastecer Salvador, o Sr. Manoel Teixeira Soares e um capataz de uma das várias fazendas de José Carlos da Mota, Custódio A. Serra, em 1855…
“Ilmº. Sr. Dr. Manoel Teixeira Soares
Mundo Novo, 24 de Abril de 1855
Com muito prazer recebi hontem a noite sua mui estimada carta datada de 19 do corrente , na qual manda V. Sr. Saber se eu quero vender-lhe o gadinho qu tenho e ao conselho da dita sua carta respondo, que prezentemente, não vendo mesmo por eu precizar para alguma matalotagem. Se eu algum dia tiver intenção de o vender a V. Sª me dirigirei dando-lhe preferência.
Sr. José Carlos não se acha neste Arraial, e sim distante daqui cinco léguas em huma sua fazenda, e só nestes 8 dias he q poderá vir, p. isso não demos o seu pusitivo, mas logo que chegue darei o seu recado tenente aos bois, apezar de que elle recebeu agora duas cartas de José Ferreira Carneiro(…) Morador na Abobreira, falando-lhe em compra dos gados q. elle aqui tem soltos, (…) do pasto, e q. em breve p. aqui vinha; avista do exposto se lhe não faz resposta tenente aos tais gados deve V. Sª. ficar siente q. são do Sr. Comisº.
Farei siente ao Sr. José Carlos suas recomendações .
Ás suas ordens, com q. congratulo consideração, e estima se afigna.
De V. Sª.
Ilmo. Amº e Resp° ,
Custódio A. Serra.”(5)
Existem alguns outros autores, inclusive ilustres como Euclides da Cunha, em sua famosa obra “Os sertões” que citam Mundo Novo, mas isso vai ser abordado aqui nesta coluna em conta gotas em outras oportunidades. Até a próxima!
Rodrigo Lopes
Graduado em História pela Uneb.
Especialista em História Social e Educação pela UCSal.
Mestrando em História Social pela UFBA.
(1)Comarcas eram as localidades que possuíam representação jurídica na Província. Feira de Santana era a Comarca mais importante do chamado baixo Sertão, juntamente com a Vila de Santo Antônio de Jacobina no início do século XIX.
(2)O texto foi transcrito como está escrito no documento original, note-se que a grafia de certas palavras e pronomes de tratamento são diferentes do modo como usamos hoje em dia.
(3)Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB). Câmaras Municipais/ Câmara de Feira de Santana/ 1835.
(4)BOAVENTURA, Eurico Alves. Fidalgos e Vaqueiros. Salvador: Centro Editorial e Didático da UFBA, 1989. pp 128/129.
(5)Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB). Presidência da Província/ Agricultura- Industria e Comércio/ Abastecimento- compra de gado/ 1855. Mais uma vez é necessário prestar atenção, pois a reprodução do documento segue a grafia da época.
Solicito mais uma vez a foto do cel Adolfo Alves Barreto, para um livro que estou escrevendo sobre os coronéis de nossa regiao. Inclusive preciso tb de dados biográficos do respeitável coronel. Por favor, me ajudem.
Edizio Mendonça – escritor
Barra do Mendes – BA.